Num mundo em que Trump, Putin, Moraes e Lula têm plateia e caneta na mão (e dois deles, um botão vermelho ao alcance dos dedos), há chance de que inocentes sejam atingidos. Podemos ter uma nova rodada de estragos a qualquer momento. Mas vamos limitar o olhar à economia do Brasil e a uma questão que pode emergir nas próximas horas ou dias. O resumo é este: se o tarifaço de 50% já bloqueava negócios de vários setores brasileiros com os Estados Unidos, pode ficar muito pior, e para todos, caso o presidente norte-americano decida embargar a Rússia.
Um enviado de Trump esteve nesta manhã com o presidente russo para uma conversa tida como crucial para a definição de novas sanções. Washington pressiona por um cessar-fogo até sexta-feira (8) na guerra contra a Ucrânia e já sinalizou disposição para tarifar em 100% países que façam negócios com a Rússia. A ideia é asfixiar Moscou, bloqueando a entrada de dinheiro que financia os ataques de Putin.
Como a eventual sanção afeta o Brasil? O potencial é devastador.
Não exportamos muito para a Rússia – foram só US$ 721 milhões no primeiro semestre, ou 0,4% de todas as vendas brasileiras ao exterior. Por outro lado, importamos muito de lá. Em valores, a Rússia é o quinto maior fornecedor do Brasil. De janeiro a junho, foram US$ 5,1 bilhões, ou 4% de tudo o que compramos do exterior.
A pauta é extremamente concentrada: os russos mandam ao Brasil basicamente combustíveis e fertilizantes. São nosso principal fornecedor de óleo diesel (60% do que o Brasil importou neste ano veio de lá) e adubo (31%).
No caso dos fertilizantes, a dependência brasileira foi muito debatida quando, às vésperas do conflito na Ucrânia, o então presidente Jair Bolsonaro viajou à Rússia para garantir a continuidade do fornecimento ao Brasil. Um representante de produtores de soja e milho afirmou, dias atrás, que um corte nesse fluxo pode até inviabilizar a produção dos grãos.
E atenção aqui: não é o governo quem importa da Rússia. São companhias privadas. Distribuidoras de combustíveis que concorrem com a Petrobras – a quem volta e meia acusam de minar a competição com preços abaixo de mercado – e empresas do agronegócio.
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Se de fato decidir bloquear a economia da Rússia, Trump dará um tempo para que o Brasil e outros importadores busquem fornecedores alternativos de diesel, petróleo, fertilizantes e tudo mais? Ou a tarifa de até 100% será aplicada de imediato e retirada apenas quando ele desejar? Valerá para todos os produtos que o Brasil exporta aos EUA ou apenas para parte deles, como a alíquota de 50%?
A experiência recente mostra que é infrutífero tentar antecipar as jogadas de Trump. Ainda mais em um xadrez que também envolve as decisões do STF contra Bolsonaro e seus aliados e apoiadores.
O que sabemos é que a situação ainda pode piorar. Trump dispõe de uma espécie de arsenal nuclear de retaliações.
Ainda que deixe a Rússia de lado, ele pode atingir o Brasil de formas ainda piores caso se aborreça mais com o tratamento dispensado a Bolsonaro. Entre elas, trabalhar para a exclusão do Brasil do Swift – sistema financeiro internacional por onde passam as transações em dólar – ou mesmo proibir outros países de negociar com o nosso.