O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, pretende sugerir ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva uma nova liberação de recursos do saque FGTS. A medida, que pode injetar bilhões na economia em 2026, visa beneficiar trabalhadores que aderiram ao saque-aniversário, mas acende um alerta entre economistas sobre o risco de inflação e a manutenção de juros elevados.
A estimativa é de que a nova liberação alcance 13 milhões de brasileiros demitidos sem justa causa desde março de 2025 e que não podem sacar o saldo devido à adesão ao saque-aniversário. Em entrevista à Folha de S.Paulo, Marinho afirmou que deve apresentar a proposta no primeiro trimestre de 2026.
A sugestão ocorre mesmo após Marinho ter classificado a liberação de R$ 12 bilhões do FGTS realizada em março como uma medida pontual. Na ocasião, ele havia garantido que o desbloqueio não abriria precedentes.
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Críticas ao saque-aniversário convivem com nova proposta de liberação
Apesar de propor nova liberação emergencial, Marinho mantém críticas ao saque-aniversário. Ele defende as alterações que restringiram a antecipação dos recursos como forma de proteção ao trabalhador.
Segundo Marinho, a prioridade da gestão é a proteção do trabalhador, que precisa contar com o FGTS em caso de demissão ou emergências, como doença. Ele argumenta que a modalidade de antecipação de longo prazo é prejudicial porque transfere totalmente o fundo para os bancos. O trabalhador paga juros sobre o próprio dinheiro, o que configura uma irracionalidade.
O pior impacto ocorre em caso de demissão, quando o trabalhador é “sacrificado” por não poder sacar seu saldo integral.
O ministro rechaça a narrativa de que a limitação do saque é uma medida paternalista. Ele classifica a lei do saque-aniversário como “leonina” (opressiva) contra o trabalhador. Muitos são levados pela propaganda, pelo impulso do dia ou pelo estado emocional a fazer pequenos saques e, posteriormente, se arrependem.
Para ele, o Estado tem a obrigação de ajustar o sistema, pois o recurso não é apenas do indivíduo, mas uma questão de bem-estar familiar que deve ser protegida. Marinho é enfático: se a defesa é pela liberalização total, para que o trabalhador faça o que quiser com o dinheiro, seria mais coerente acabar com o fundo e fazer o trabalhador receber o valor na folha de pagamento.
Em um cenário de juros elevados, a antecipação do saque-aniversário do FGTS é uma modalidade de crédito das mais baratas para rolar dívidas em um momento de grande endividamento e inadimplência. Segundo o BC, enquanto a taxa média de juros do cheque especial estava em 7,61% ao mês em setembro, a maior desde fevereiro de 2025, e a do rotativo do cartão de crédito em 15,15%, a da antecipação do saque-aniversário do FGTS fica em torno de 1,6% ao mês.
Restrições ao saque-aniversário são questionadas no STF
Enquanto o ministro defende as restrições, as novas regras do saque-aniversário entraram no foco do Supremo Tribunal Federal. O partido Solidariedade apresentou uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) para questionar a resolução do Conselho Curador do FGTS que alterou a modalidade.
As novas regras entraram em vigor no dia 1º deste mês. Para o partido, o Conselho Curador extrapolou seu poder regulamentar, pois as restrições deveriam ter sido estabelecidas por lei. O Solidariedade argumenta que a norma esvaziou uma ferramenta de autonomia financeira e representa um retrocesso social para o trabalhador.
A ação judicial contesta diversas restrições impostas, incluindo:
- Estabelecimento de carência de 90 dias para autorizar a consulta de saldo e contratar a antecipação de crédito.
- Limitação do número de saques-aniversário dados como garantia em empréstimos a cinco parcelas anuais (com redução para três após 31 de outubro de 2026).
- Proibição de contratar mais de uma operação de crédito por competência anual.
- Fixação de um teto de R$ 500 para a alienação de cada parcela.
A ministra Cármen Lúcia é a relatora da ação no STF, que foi protocolada com pedido de liminar.
Economistas temem pressão sobre inflação e Selic
O debate sobre uma nova liberação do FGTS acontece em um cenário de cautela econômica, especialmente em relação à inflação e aos juros.
A liberação de R$ 12 bilhões realizada em março foi motivada pela busca por injetar recursos na economia, diante da perspectiva de desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB). Na época, o governo também buscava melhorar a popularidade do presidente, que enfrentava índices de desaprovação.
Uma eventual nova liberação se somaria a outras medidas que podem favorecer a reeleição de Lula, como a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais e a expansão de linhas de crédito habitacional para a classe média.
Analistas alertam que medidas de estímulo como o saque de FGTS, que injetam bilhões na economia, geram riscos de pressão inflacionária adicional. O aumento da demanda por bens e serviços resultante da injeção de recursos tende a pressionar os preços.
A inflação em 12 meses está bem distante da meta de 3% ao ano fixada pelo Conselho Monetário Nacional. Em setembro ficou em 5,17%.
Com a inflação em alta, o BC precisa manter uma política monetária mais restritiva. A Selic, em 15% ao ano — maior patamar desde 2006 —, deve permanecer elevada por mais tempo. As perspectivas para um corte na taxa estão ficando cada vez mais distantes. O mercado ainda acredita que possa haver uma redução na primeira reunião do próximo ano, em janeiro, mas há instituições financeiras sinalizando que isso só possa ocorrer em março.










