Pesquisadores australianos testam o primeiro tratamento preventivo contra o HTLV-1, vírus que atinge cerca de 10 milhões de pessoas no mundo e é considerado um “primo” do HIV.
A descoberta foi publicada na revista Cell, em 10 de julho, após uma década de estudos em camundongos com células imunológicas humanizadas. A investigação revelou que dois medicamentos usados contra o HIV, o tenofovir e o dolutegravir, impediram a transmissão do HTLV-1 nos animais, criando um estado indetectável semelhante ao que acontece com o vírus causador da aids.
A pesquisa também demonstrou que a combinação dos antivirais com um inibidor celular matou as células infectadas, o que não ocorre com o HIV, abrindo uma possibilidade de cura para a doença.
O HTLV-1 é causador de leucemia e inflamações neurológicas, ainda que só seja sintomático em uma pequena parcela da população que convive com ele. O vírus ainda não tem cura ou tratamentos aprovados. A nova estratégia pode evitar o avanço da infecção antes que ela afete o sistema imunológico de forma irreversível.
O que é o HTLV?
- O HTLV é um retrovírus que infecta células do sistema imunológico, assim como o HIV.
- Estima-se que até 2,5 milhões de brasileiros estejam infectados com ele, fazendo do Brasil um dos países com mais casos no mundo.
- Apenas 5% a 10% dos infectados desenvolvem doenças graves, como mielopatia ou leucemia de células T, que pode ser fatal, mas com a quantidade de infecções, essa cifra se torna preocupante.
- Assim como o HIV, o HTLV pode ser transmitido por sexo sem proteção, sangue contaminado, agulhas infectadas e de mãe para filho. Em crianças, esta infecção é particularmente preocupante.
- Não há cura para o HTLV. A prevenção e o diagnóstico precoce, especialmente durante o pré-natal, são as principais formas de controle.
HTLV-1 ainda é vírus negligenciado
O vírus infecta as células T, o mesmo alvo do HIV, mas os sintomas podem demorar décadas para surgir. Quando aparecem, a infecção geralmente já compromete o sistema imunológico, levando a doenças graves e morte precoce.
Os testes foram realizados com camundongos transplantados com células humanas suscetíveis às infecções. A equipe utilizou variantes do HTLV-1 encontradas na Austrália Central e em outros países. Ambas causaram doenças nos modelos.
“É a primeira vez que um grupo de pesquisa conseguiu suprimir esse vírus em um organismo vivo”, celebrou o infectologista Marcel Doerflinger, um dos líderes do estudo.
Terapias do HIV aceleram aplicação
Como o tenofovir e o dolutegravir já são usados na prevenção e tratamento da aids, os pesquisadores apontam que o caminho até ensaios clínicos com humanos deve ser mais curto e seguro.
Além disso, foi testada uma combinação com um composto que inibe a proteína MCL-1. Essa substância ajuda células doentes a sobreviverem. Com o bloqueio da MCL-1, as células infectadas foram eliminadas, reduzindo a progressão da doença.
OMS inclui vírus entre ameaças globais
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou o HTLV-1 como um patógeno ameaçador para humanos em 2021. A decisão veio após pressão de cientistas para a defesa de populações com sistemas imunes mais comprometidos, como idosos, crianças e indígenas, que mais sofrem com casos graves da doença.
Damian Purcell, professor da Universidade de Melbourne e um dos responsáveis pelo estudo, afirma que é preciso pensar mais fortemente nas pessoas em risco de HTLV-1. “Elas merecem ferramentas terapêuticas como aquelas disponíveis contra o HIV e agora temos uma oportunidade real de erradicar essa doença”, celebrou.
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