O Banco Central encerrou o projeto do Drex, o Real Digital. A decisão foi tomada durante uma reunião com representantes dos consórcios que integravam a iniciativa, e o desligamento da plataforma poderá ocorrer já na próxima semana.
Pedro Magalhães, empreendedor no mercado de ativos digitais, felicita o encerramento da iniciativa. Segundo ele, a plataforma desenvolvida para o Drex foi encerrada pelo Banco Central por não atender aos critérios mínimos de privacidade e por custos elevados de transação.
Outra fonte do mercado de ativos digitais, que preferiu não se identificar, confirmou à Gazeta do Povo que o assunto já vinha sendo amplamente comentado no setor: “O ecossistema aguarda maiores esclarecimentos sobre resultados alcançados e valores despendidos”.
De acordo com o Valor Investe, uma pessoa ligada ao projeto teria descartado o fracasso da experiência, já que teria evidenciado os benefícios que a tecnologia blockchain pode proporcionar. “O entendimento do Banco Central é que não é viável manter uma infraestrutura estatal para viabilizar esses negócios”, disse a fonte ao portal.
Falta de privacidade e vigilância foram pontos criticados do Drex
O projeto do Drex foi alvo de questionamentos, especialmente por representantes da direita, que afirmavam que o Real Digital poderia se tornar um instrumento de “vigilância estatal” e de “censura e controle social”.
Em agosto deste ano, o coordenador do Drex no Banco Central, Fábio Araújo, informou que o BC deixaria de lado o uso da tecnologia blockchain, pois não teria sido possível garantir a privacidade das transações entre instituições financeiras. Desde então, a autoridade monetária não se pronunciou oficialmente sobre o tema.
Em setembro, houve adiamento no lançamento da iniciativa, além da redução do escopo do projeto, que passou a ter uma versão mais “tímida”. À época, as informações indicavam que o Drex seria utilizado apenas em transações entre instituições participantes, sem acesso direto do público.
Diante da falta de garantias de privacidade — já que as redes blockchain são essencialmente públicas —, chegou-se a cogitar que alguns produtos financeiros tokenizados pudessem ganhar uma versão simplificada, com liquidação fora do ambiente digital. O próprio BC admitiu, no início de 2024, que a questão da privacidade não havia sido resolvida.
Segundo Magalhães, desde o ano passado, as reuniões técnicas entre os participantes dos consórcios já traziam críticas recorrentes à privacidade. “O BC pisou no freio em vários testes-piloto, especialmente em casos de uso com recebíveis tokenizados (cartão, CDBs, títulos públicos)”, afirma.
“Não houve falha tecnológica, mas contradição de modelo”, afirma especialista
Para Magalhães, as questões envolvendo o Drex não são decorrentes da tecnologia blockchain, que não tem problemas de privacidade por si só: “O desafio real era conciliar privacidade absoluta com controle operacional centralizado do Banco Central”.
Segundo o desenvolvedor, que foi um dos primeiros a detectar o controle absoluto que o Drex proporcionava ao seu controlador, a centralização é intrinsecamente oposta ao propósito das criptomoedas, que é a descentralização, transparência e resistência ao controle estatal.
“Não era uma falha tecnológica: era uma contradição de modelo. Não se pode ter sigilo bancário total em uma rede distribuída e comando único do regulador. Tentaram unir dois polos positivos que, por natureza, não coexistem”, diz.
Novos estudos sobre o Drex podem estar a caminho
Mesmo diante da impossibilidade de solucionar as questões de privacidade, o projeto pode não ter sido inteiramente descartado. Segundo o Valor Investe, novos estudos no âmbito do Drex estão programados para o início de 2026.
Entre as iniciativas previstas estão um levantamento dos benefícios identificados pelos participantes com as ferramentas desenvolvidas no projeto e a busca por modelos de negócio que possam viabilizá-las. Em seguida, devem ser discutidas as possibilidades tecnológicas dessas soluções e como podem ser disponibilizadas.
Ainda de acordo com fonte ouvida pelo portal, a inovação deve continuar, mas “liderada pelo mercado”, com um regulador mais capacitado e engajado no tema.
“O principal desafio será a fragmentação das soluções, justamente um dos fatores que motivaram a criação do Drex como plataforma tecnológica agregadora. Com o tempo e a maturidade do ecossistema, no entanto, a tendência é que o próprio mercado se ajuste”, disse a fonte.
André Carneiro, presidente da BBChain, integrante de um dos consórcios do Drex, disse em nota à imprensa que “novos modelos de negócios, com escopo mais direcionado pelo mercado, podem ter requisitos atendidos sem as eventuais restrições regulatórias do piloto Drex, liberando o potencial das tecnologias DLT/Blockchain e cabendo ao mercado um maior papel nessa evolução”.













