Apontado pela Polícia Federal (PF) como controlador de três entidades da Farra do INSS, o empresário Maurício Camisotti fez transações de R$ 1,2 milhão com uma fintech e uma casa de câmbio suspeitas de ligação com o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Os repasses aparecem em relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que abasteceram a Operação Sem Desconto, deflagrada em abril deste ano contra o esquema bilionário de descontos indevidos sobre aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), revelado pelo Metrópoles.
Maurício Camisotti (foto em destaque) foi preso pela PF no dia 12/9 junto com o lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS, apontado como operador financeiro do esquema. Segundo a investigação, Camisotti controlava três entidades que faturaram mais de R$ 1 bilhão desde 2021 com a farra dos descontos indevidos. Empresas ligadas a ele repassaram ao menos R$ 25,5 milhões ao lobista.
Transações suspeitas do empresário da farra
Nos relatórios do Coaf que apontam transações suspeitas de lavagem de dinheiro, consta um repasse de R$ 568 mil de Camisotti à Guardiões Cambio e Turismo. A empresa está formalmente em nome de Valdecy Soares Coelho, que declara morar em um apartamento de 38 m² no Brás, centro São Paulo, cujo aluguel é de R$ 1,3 mil.
Valdecy e sua empresa são acusados pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) de servirem de laranjas para a lavagem de dinheiro de hotéis da Cracolândia controlados pelo PCC. Sua empresa, tida como fachada, tem registro formal na Avenida Senador Queiros, perto da região da 25 de Março, no centro.
Segundo a Polícia Civil paulista, a Guardiões movimentou R$ 100 milhões em apenas dois anos e Valdecy fez, em contas de outras empresas de fachada, depósitos em espécie de centenas de milhares de reais. Em apenas uma ocasião, depositou R$ 430 mil em dinheiro vivo em uma dessas contas.
O MPSP afirma que a atuação de Valdecy “dentro da organização é essencial para garantir que o dinheiro do tráfico circulasse de forma legalizada”.
“O ato de lavagem de capitais praticado por Valdecy Soares Coelho envolve a realização de depósitos em espécie e a movimentação de grandes quantias de dinheiro em contas bancárias associadas a empresas de fachada. Esses depósitos visam ocultar a origem ilícita dos recursos obtidos com o tráfico de drogas, dando-lhes uma aparência de legalidade”, diz o MPSP.
Na lista de transações de Camisotti, também aparece um repasse do BK Bank no valor de R$ 518 mil ao empresário da Farro do INSS. A fintech é alvo de operações da PF e do MPSP contra esquema bilionário de fraudes, sonegação e lavagem de dinheiro de empresas do setor do combustível suspeitas de elo com o PCC.
A fintech serviu para ocultar valores milionários relacionados às empresas Copape e Aster. Também recebeu repasses de fundos de investimentos da Faria Lima usados pelos empresários Mohamad Mourad e Roberto Augusto Leme da Silva, o Beto Louco, que, por sua vez, foram usados para adquirir refinarias e imóveis de luxo.
Investigações da Polícia Federal apontaram a relação desses empresários com braços do PCC no mercado de postos de gasolina e distribuidoras de combustíveis. O BK Bank, segundo a PF, ocultava os verdadeiros donos do dinheiro que passava por sua custódia e afirmava que apenas armazenava, em uma mesma conta em seu nome, recursos de diversos clientes.
Esse tipo de expediente é conhecido no mercado como conta bolsão, usualmente aberta por uma fintech em um outro banco para depositar o dinheiro de diversos clientes. Dessa forma, somente a fintech tem controle sobre a identidade dos beneficiários finais do recursos, que ficam blindados de comunicações ao Coaf sobre operações suspeitas e do Banco Central para fins de bloqueio.
Procurada pelo Metrópoles, a defesa de Maurício Camisotti não retornou até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto.
“Banco paralelo”
- As investigações apontam que a BK Bank centralizava as movimentações financeiras de empresas de fachada envolvidas no ecossistema criminoso no setor de combustíveis.
- A fintech movimentou mais de R$ 46 bilhões não rastreáveis entre 2020 e 2024 para a organização criminosa.
- Os criminosos aproveitavam da opacidade garantida pelas fintechs para operar o dinheiro obtido nas diversas etapas de fraude.
- Era por meio da instituição que era feita, por exemplo, a emissão de nota fiscal para a importação de produtos químicos desviados na adulteração de combustível.
- Ela também fazia o recolhimento dos lucros e operava a lavagem do dinheiro para o mercado formal.
- A BK Bank também recebia diretamente valores em espécie do esquema, um procedimento apontado como estranho à natureza da instituição de pagamento.
- Entre 2022 e 2023, foram efetuados mais de 10,9 mil depósitos em espécie na fintech, totalizando mais de R$ 61 milhões.