Com a entrada em vigor, no dia 6 de agosto, do tarifaço de 50% imposto pelo presidente Donald Trump, os preços do café brasileiro tornaram-se inviáveis para venda aos Estados Unidos, o que fez despencar as exportações do produto para lá. Enquanto isso, o consumidor americano paga cada vez mais caro pela bebida.
De acordo com o Departamento de Estatísticas de Trabalho dos EUA (BLS, na sigla em inglês), no mês de agosto, o preço do café subiu 3,6%, nove vezes a inflação oficial para o período (0,4%). Com isso, o produto já acumula alta de 20,9% em doze meses, a maior taxa em 28 anos.
Desde o início do tarifaço, os importadores dos EUA passaram a buscar fornecedores alternativos, como a Colômbia, para a variedade de café arábica, e o Vietnã, para o café robusta. As exportações do vizinho brasileiro para os EUA recolhem uma tarifa de 10%, enquanto o país asiático recebe uma taxação de 20%.
A inclusão do produto na lista de exceções à tarifa sobre produtos brasileiros era dada praticamente como certa em razão da dependência dos Estados Unidos da produção brasileira. O Brasil é o maior fornecedor global de café, enquanto os EUA são o principal mercado importador do grão no mundo.
Dias antes da entrada em vigor do tarifaço sobre exportações brasileiras, o próprio secretário de Comércio dos Estados Unidos, Howard Lutnick, chegou a afirmar que o governo americano considerava zerar a tarifa para alimentos que não são produzidos em seu país, citando o café.
A decisão de taxar a commodity inaugurou um período de forte incerteza no mercado global.
Negociadores tanto do mercado físico de café quanto de contratos futuros entraram em compasso de espera, aguardando um possível acordo entre Brasil e EUA para o comércio do produto, até agora sem desfecho.
No dia 6 de agosto, quando entrou em vigor a nova tarifa americana sobre exportações brasileiras, o café arábica era negociado a US$ 286 por cem libras-peso na Bolsa de Nova York, enquanto o robusta, a US$ 3.340 por tonelada na Bolsa de Londres.
As cotações representavam uma queda relevante desde os patamares recordes de 2024, quando os contratos chegaram a US$ 448 e US$ 5,8 mil, respectivamente, em razão da baixa movimentação do comércio internacional.
A partir do início das tarifas sobre produtos brasileiros, no entanto, o comércio do grão voltou a crescer, principalmente por parte de Estados Unidos, Europa e Ásia, em antecipação a novas altas e em razão do aumento do consumo no Hemisfério Norte, em razão da aproximação do inverno.
O aumento da demanda, somado a uma redução na oferta de café brasileiro na safra 2025/26 e de perdas provocadas por geadas na região do Cerrado Mineiro, fez com que os preços dos grãos invertessem a tendência e passassem a subir, atingindo, no dia 31 de agosto, US$ 386 para o café arábica, e US$ 4.815, no caso do robusta – altas de 34,9% e 44,2%, respectivamente, em cerca de um mês.
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“Com a cotação de US$ 386 na Bolsa de Nova York mais a tarifa de 50%, o café arábica brasileiro custaria US$ 579 para o importador americano, mais alto do que a máxima histórica do ano passado, de US$ 448”, diz Márcio Ferreira, presidente do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). “As tarifas são proibitivas para se comprar café brasileiro.”
Em agosto, exportações de café para os EUA caíram 46% em relação a 2024
Conforme o Cecafé, o Brasil embarcou para os EUA, em agosto, 301 mil sacas, todas de vendas feitas em julho que atrasaram por problemas logísticos ou de contratos firmados antes do dia 6 de agosto.
No mesmo mês de 2024, o volume foi de 563 mil sacas, o que significa um recuo de 46,5% de um ano ao outro.
Além de reflexo do tarifaço, a queda é resultado também de base de comparação bastante acima da média – no ano passado o Brasil registrou recorde de exportação de café.
Na comparação com o mês de julho de 2025, quando foram exportadas 408 mil sacas para o mercado americano, a redução no volume embarcado é de 26,2%.
“É importante fazer essa análise mensal, porque se a safra deste ano é menor, necessariamente as exportações já iriam cair, independente das tarifas”, explica Ferreira.
Ele compara ainda com o mercado alemão, que em agosto importou 414 mil sacas de café brasileiro, superando, no mês, os EUA como principal comprador da commodity brasileira.
“Enquanto os Estados Unidos reduziram 46% das importações na comparação anual, a Alemanha caiu 24% em relação ao ano passado”, diz o presidente do Cecafé. Na comparação com julho, quando o Brasil vendeu 265 mil sacas, os alemães aumentaram suas compras de café brasileiro em 56,2%.
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EUA ainda devem comprar café brasileiro, mas podem substituí-lo gradualmente
Os números ainda não refletem uma realocação das exportações brasileiras, segundo Ferreira, uma vez que as compras de países europeus também tendem a aumentar a partir do segundo semestre, em razão da colheira da safra brasileira e da aproximação do inverno no Hemisfério Norte.
Para a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a substituição do café brasileiro pelo produto de outras origens no mercado dos Estados Unidos não será fácil. “Primeiro: porque a oferta e a demanda global estão ajustadas e com o menor estoque dos últimos 25 anos, segundo: porque os Estados Unidos teriam que disputar esse café substituto com outros importantes polos de importação, como a Europa, por exemplo”, diz boletim do órgão.
“Nesse contexto, a tendência é de aumento dos preços do café nos Estados Unidos e em outros importantes polos consumidores.”
Uma das preocupações dos exportadores brasileiros do setor cafeeiro é com uma mudança gradual no hábito do consumo de café nos EUA. Segundo um executivo americano do setor, em razão dos altos custos, há uma tendência de se reduzir gradativamente o grão brasileiro nos blends vendidos nas prateleiras americanas.
Como alteração ocorre de forma gradual, o consumidor não deve notar a diferença como ocorreria caso a substituição fosse feita de maneira súbita. “Isso pode nos levar a um prejuízo que é muito difícil de recuperar”, diz o presidente do Cecafé.